PROJETO GRUPOS DE VIDA

1- POR QUÊ GRUPOS DE VIDA?

O GV é uma realidade a ser pensada para além dos âmbitos da formação inicial, pois o que vivemos hoje no seminário deve ser apenas o presságio do que deverá ser nossa vida presbiteral. Evidentemente, a vida comunitária tem seus desafios dos quais não se foge, mas deve-se encará-los como oportunidade de crescimento individual e coletivo. Fazem parte desses desafios dois perigos que espreitam a vida da comunidade: fechar-se egoisticamente ou lançar-se desesperadamente. Alguns para se protegerem, podem construir uma parede à sua volta. Outros se podem lançar perdidamente nos encontros interpessoais contando todas as suas emoções, em nome da troca e da partilha. Os primeiros tendem a viver para si mesmos, numa falsa solidão. Os segundos tornam-se superdependentes dos outros e não existem por si mesmos.
É difícil encontrar equilíbrio entre solidão e comunhão. Antigamente corria-se o risco de ignorar o dom da comunidade e da partilha. Hoje se corre o risco de se esquecer do dom da vida e as necessidades profundas do coração humano. Para viver plenamente em comunidade é preciso primeiro existir, ser capaz de ficar de pé, ser capaz de amar. A comunidade não é um refúgio, mas um caminho.
Para crescer humanamente, para nos tornarmos mais livres interiormente, precisamos, ao mesmo tempo, de partilha, oração comunitária, e também de tempo de solidão, de reflexão, de interiorização e de oração pessoal.
Na solidão descobrimos uns aos outros novamente; algo dificilmente atingível por meio da presença física. Reconhecemos entre nós laços que não dependem de palavras, de gestos ou ações e que são mais profundos e mais fortes do que aqueles que poderíamos criar com nossos esforços.
Solidão e comunidade pertencem uma a outra, precisam uma da outra, como o centro e a circunferência de um mesmo círculo. A solidão sem comunidade leva ao sentimento de desespero. A comunidade sem solidão leva-nos a um vazio de palavras e emoções.
A vida comunitária implica uma atitude interior, sem a qual ela se desfaz: vontade de crescer. Preciso ter a atitude da criança que se abandona, que sabe apenas ser uma partícula do universo e que é chamada a viver no dom e na oblação, aí no lugar onde está. Quando não se tem mais esse coração de criança, que procura ser instrumento de paz e de unidade, desanima-se ou pretende-se provar que é alguém. Em ambos os casos destrói-se a comunidade.
Os GV representam, no seio da comunidade, uma possibilidade de crescer comunitariamente, uma oportunidade entre solidão e comunhão. Para que isso seja possível é necessário que se respeite cada etapa no processo formativo do GV, conforme veremos a seguir.
A validade deste trabalho só poderá ser notada em longo prazo, se cada um se dispuser a abraçar o compromisso de crescer ao longo da caminhada formativa. Claro que, quando abordamos a formação como processo, não queremos reduzi-la unicamente ao período de estudos no seminário, mas como algo que perpassa toda a vida daquele que se dispõe a seguir o Mestre. E de fato se assim foi com os primeiros discípulos, não poderia ser diferente com os de hoje, justamente porque quem forma é o Mestre.

2- ORIGEM DOS GRUPOS DE VIDA

Os Grupos de Vida nasceram na Espanha e estão se tornando em muitos Seminários um instrumento eficaz de vida comunitária. Graças a este treinamento permanente ao exercício da vida fraterna os seminários vão se transformando sempre mais em ambientes familiares. Tornam-se testemunhas do Evangelho. Os seminaristas sentem-se mais seguros e entusiastas na caminhada formativa. Cada um vai assumindo o protagonismo da própria formação e a responsabilidade pelo crescimento de seus colegas.
Os sacerdotes assim formados tornam-se autênticos animadores de vida comunitária e são capazes de fraternidade presbiteral, superando assim suas crises afetivas e mesmo ministeriais sem tantos desgastes pessoais ou eclesiais. Afinal, a capacidade para viver em comunhão não se improvisa. É um treino permanente no qual a pessoa deve passar pela ?morte do homem velho? (egoísta) para alcançar sempre mais a estatura do homem novo em Cristo. Nesta páscoa (da morte à vida), mediante a ação do Espírito (pois sem Ele nada podemos), o seminarista vai sendo transformado à imagem de Cristo Bom Pastor que dá a vida pelo Rebanho.
Quem se acostumou a viver pelos outros, não de modo teórico, mas existencial, na realidade do seminário, será sem dúvida um homem capaz de amar a todos os que dele se aproximarem, no dia a dia do seu ministério pastoral, e evangelizará mais pelo testemunho que pela palavra. É deste tipo de presbíteros que a Igreja precisa para o próximo milênio. Jesus mesmo quis constituir um Grupo de Vida e escolheu 12 para estarem com Ele. Ele mesmo partilhava sua vida com seus amigos (assim os considerava) e ensinava-lhes a arte do céu: a vida de comunhão no amor recíproco traduzido na partilha generosa, no serviço humilde, no perdão sem limites e no acolhimento dos pobres e pequeninos.
Imaginemos, ou melhor, tomemos consciência de que esta experiência vivida pelos 12 nos é hoje oferecida, aqui na nossa casa de formação. Ele nos escolheu para estarmos com Ele. Para aprendermos dele a arte da comunhão. Para tornarmo-nos, não burocratas do evangelho, mas presenças vivas do Senhor no meio do seu povo. Não apenas presenças individuais e no futuro, mas já hoje e também coletivamente, pois Ele nos alerta: nisto reconhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros como eu vos amei.

3- OBJETIVOS GERAIS DOS GRUPOS DE VIDA

No seu livro Grupos de Vida, o psicólogo assessor do Seminário Nacional São José, da Costa Rica, Gastón Mézerville, assim coloca os objetivos dos GV:
1- Criar uma estrutura básica de apoio ao trabalho formativo dos formadores em relação à vida pessoal de cada seminarista, organizada e dirigida pastoralmente pelo Conselho de Formadores do Seminário.
2- Promover a responsabilidade pessoal pelo projeto pessoal de crescimento finalizada à maturidade humana, cristã e sacerdotal de cada seminarista.
3- Proporcionar um ambiente de solidariedade fraterna, que possibilite de maneiras concretas o crescimento harmônico dos membros do grupo nas quatro áreas básicas: Oração, Relacionamento, estudo e serviço.
4- Promover uma experiência a respeito dos benefícios que derivam do diálogo habitual, da transparência na partilha, do apoio oportuno nas áreas básicas, e do exemplo dos outros como estímulo para o crescimento pessoal.
5- Promover relações sadias e maduras de companheirismo e amizade no seminário, de modo que os formandos não necessitem de amizades particulares e exclusivistas.
6- Habituar o seminarista no exercício da liderança e da subordinação adequadas em contexto grupal, bem como a uma experiência prática sobre a dinâmica das relações de grupo.
7- Ensinar ao seminarista um modelo concreto de apoio pastoral, aplicável, com as variantes de cada caso, à vida dos leigos na Igreja, preparando-o assim para a sua futura missão na promoção de lideranças e no funcionamento adequado dos grupos eclesiais, que tornem mais efetiva a cura pastoral do povo de Deus a ele confiado.
8- Fomentar o estabelecimento de relacionamentos de amizade que possam perdurar no tempo e constitua um apoio efetivo para o decorrer da vida sacerdotal futura e atual.
Destes objetivos resulta evidente a necessidade de um Programa para os Grupos de Vida onde estejam envolvidos os formandos e formadores, onde os seminaristas assumam uma maior responsabilidade pelo próprio crescimento e de seus companheiros de grupo, nas áreas básicas da vida. Deste modo os diversos membros da comunidade do seminário, reunidos pelo Espírito na única fraternidade, colaboram, cada um segundo seu próprio dom, ao crescimento de todos na fé e na caridade, para que se preparem adequadamente ao sacerdócio (PDV 60).

4- FUNDAMENTAÇÃO DOUTRINAL DOS GRUPOS DE VIDA

Em Optatam Totius, 43 lê-se: Em geral, cultivem-se nos alunos as qualidades convenientes, sobretudo as que se referem ao trato com os homens, como são a capacidade de escutar os outros e de abrir a alma com espírito de caridade ante as variadas circunstâncias das relações humanas?.
A "Pastores Dabo Vobis", 60 insiste: ?do ponto de vista humano, o Seminário Maior deve tornar-se uma comunidade estruturada por uma profunda amizade e caridade, de modo que possa ser considerada uma verdadeira família que vive na alegria, e não apenas um lugar de moradia.
Já nas Orientações para a Educação ao Celibato Sacerdotal, 598, é proposto o seguinte: outra orientação da qual depende a boa caminhada da comunidade juvenil do seminário refere-se às relações interpessoais que devem distinguir-se por uma confiança familiar e uma amizade fraterna. O seminário deve ser uma escola de amizade, deve fomentar a fraternidade a nível humano, inclusive; a verdadeira educação para o celibato deve estar enraizada profundamente na fraternidade.
O papa João Paulo II na Exortação Vida Consagrada 67, depois de referir-se à necessidade de se ter o cuidado de facilitar a integração harmônica dos diversos aspectos da formação, detém-se sobre a comunidade como lugar privilegiado da formação e diz: "Nela se realiza a iniciação à fadiga e ao gozo da convivência. Na fraternidade cada um aprende a viver com quem Deus colocou ao seu lado, aceitando tanto as suas qualidades positivas como suas peculiaridades e seus limites. Aprende especialmente a partilhar os dons recebidos para a edificação de todos, uma vez que ?a cada qual é dada a manifestação do Espírito para o proveito de todos" (1Cor. 12,7).
Ora, transformar o seminário em uma "Escola de Amizade" requer um ambiente organizado com sabedoria e prudência que possibilite a formação dos seminaristas no estabelecimento de relações interpessoais satisfatórias e maduras. O documento Orientações para a Educação ao celibato sacerdotal insiste em afirmar: ?o sacerdote deve ser capaz de verdadeiras e boas amizades, especialmente úteis para a expansão afetiva, quando cultivadas na fraternidade sacerdotal.


5- ESTRUTURA DOS GRUPOS DE VIDA

Passos para estruturar verdadeiramente um GV:
  • Conscientizar sobre a importância dos GV: A partir dos desafios de se viver em comunidade, o primeiro passo para se estruturar os grupos de vida na comunidade de formação é saber o que são, quais seus benefícios, como funcionam etc. Não se trata de copiar experiências, mas sim estudá-las e adaptá-las à realidade concreta de cada comunidade formativa.
  • Aprovar a criação dos GV: Por se tratar de um acontecimento que vai nortear toda a vida da comunidade de formação, é necessário primeiro que formadores e formandos estejam convencidos da importância dos grupos para que haja consenso sobre sua criação e êxito na sua condução.
  • Organizar a comunidade formativa por GV: Necessário levar em consideração a realidade da comunidade de formação: o número de formandos, etapas formativas, horários da casa, tarefas desempenhadas pelos formandos etc. Os GV não são uma tarefa a mais ou a parte. Se não se levar em consideração todos os aspectos da comunidade, tornar-se-á uma experiência negativa ou se criarão mais problemas na comunidade. É bom lembrar que as experiências apontam que não deverão ser formados grupos com menos de 4 membros, nem mais que 8 membros.
  • Dar um nome para cada GV: O nome reflete a identidade do grupo. É um elemento motivador e inspirador da caminhada. Por isso, deve ser uma escolha refletida a partir da própria característica do grupo. Ter nome significa ser valorizado na própria individualidade e autonomia.

6- FUNCÕES DOS PARTICIPANTES DO GV

1- O Conselho de Formadores: É de sua responsabilidade aprovar a criação e supervisionar a caminhada geral dos GV, a partir e à luz do projeto de formação do seminário da diocese. (Responsável: Equipe de Formação)
2- O Formador encarregado: Faz a ligação entre a equipe de formação e a comunidade formativa a partir do GV e deverá: dialogar com a comunidade formativa sobre essa experiência grupal; ter diálogo aberto com o coordenador ou coordenadores dos grupos, bem como ter um diálogo frequente com o assessor dos grupos. (Responsável: Formador de cada casa)
3- O Assessor: Este assume a responsabilidade pelos aspectos organizativos e pela dinâmica dos grupos: capacitação geral dos coordenadores dos grupos; avaliação periódica do processo; escuta e orientação quando surgirem dificuldades, bloqueios e conflitos. Havendo dificuldade de ocupar todas as funções o assessor pode ser o próprio formador ou um membro externo da equipe de formação como o psicólogo da comunidade formativa. (Responsável:  Um formador)
4- O Coordenador: Os membros de cada grupo devem eleger o seu coordenador pelo período de um ano, podendo inclusive ser reeleito por vários anos. (Responsável: Um formando para cada grupo).
Enfim, para os GVs produzirem frutos todos precisam ter clara consciência do estágio de formação dos membros, da realidade da comunidade de formação, da realidade e dos propósitos formativos da diocese; enfim, da realidade toda que nos circunda. Ora, não basta querer chegar a um lugar qualquer; é preciso saber para onde se vai e projetar o caminho a ser percorrido, sem improvisar e sempre atento aos desafios que se apresentam.
Necessário:
1- Os coordenadores dos grupos de vida deverão reunir-se sempre que julgar necessário. Bom seja assegurar essa data mensal no calendário da comunidade.
2- Cada coordenador deverá reunir-se com seu grupo mensalmente, com a presença ou não do assessor, para avaliações e encaminhamentos. Sempre que perceber um esfriamento ou distanciamento do objetivo o assunto precisa ser tratado com o assessor ou formador responsável.
3- Toda proposta precisa ser apresentada ao formador de cada casa ou ao reitor antes de qualquer encaminhamento;
4- Manter diálogo constante entre os coordenadores dos grupos com atenção ao calendário da comunidade para facilitar a organização dos eventos internos e externos de acordo com as datas estabelecidas no calendário anual.
5- Cabe aos Grupos de Vida exercitarem e fortalecerem a comunidade formativa do seminário de modo que ela possa cumprir sua missão por excelência: formar novos presbíteros para a Igreja.